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quinta-feira, 5 de agosto de 2010

LITURGIA (Parte I)


INTRODUÇÃO

A presente pesquisa, mesmo que de forma sintética, quer apresentar a importância da vida litúrgica na vida da Igreja, pois a medida em que passamos a conhecer melhor a liturgia, melhor também, passamos a celebrá-la. A liturgia sendo um encontro, não um encontro qualquer-convencional, mas de batizados que professam a mesma fé, reúne, integra a vida dos que se congregam.

A liturgia em seu mistério compreende o mistério de Deus, de Cristo –centro da ação litúrgica, do homem, da Igreja, do culto. No mistério de Deus, a liturgia quer apresentar as maneiras, se assim podemos dizer, pelas quais Deus misterioso e invisível, torna-se visível; no mistério de Cristo, sua condição divina-humana, como, também sua páscoa. Páscoa do homem também; do homem como um agente que está dentro e não como mero receptor; da Igreja como mediadora e anunciadora da Revelação, por conseguinte da liturgia. Por fim, do culto como uma ação envolvente e que une os crentes em torno de todos os mistérios.


CAPÍTULO I

DOS CONCEITOS DOS TERMOS LITURGIA E MISTÉRIO

1.1 – Do termo LITURGIA

Faz-se necessário, primeiramente, expor e contextualizar o termo liturgia e sua evolução com o passar do tempo, pois é sabido que a palavra não tinha um sentido religioso-cristão. O termo liturgia surge pela primeira vez na Grécia antiga, precede a língua grega clássica.

A palavra é composta por duas raízes grega, LEIT de laós = povo e ERGON = ação, empresa, obra. Entendia-se por liturgia uma ação, obra, empresa para o povo ou para o público. Na Grécia antiga, por volta do século VI a.C., designava-se liturgia um serviço público feito para o povo por alguém de posses. Tinha também um caráter de festividades populares, como a promoção de jogos olímpicos ou ainda um destacamento militar.

Nos séculos III a I a.C., a palavra sofre mudança em seu sentido. Passa a ter um sentido de trabalho, seja ele designado por um determinado grupo como castigo, punição por alguma desobediência ou trabalho em reconhecimento a honras recebidas.

A palavra liturgia também será empregada como serviço de um servo para com seu senhor ou um favor de um amigo para outro. Nesse último contexto, a palavra perde o caráter de serviço público. É nesse período que o termo liturgia é usado cada vez mais em sentido “religioso-cultural”, indica o serviço que algumas pessoas, previamente escolhidas, prestavam aos deuses.

Na tradução dos LXX, ainda antes de Cristo, o termo aparece no Antigo Testamento 170 vezes, designando sempre o culto prestado a Javé. Não por qualquer pessoa, mas só por sacerdotes e pelos levitas no templo de Jerusalém. Depois de Cristo, os primeiros cristãos, cristianismo primitivo, adotaram o termo como culto realizado em espírito e verdade, cf At. 13,2. “Celebrando eles o culto em honra do Senhor e jejuando, disse-lhes o Espírito Santo: separai para mim Barnabé e Saulo, para a obra à qual os destinarei”.

No NT testamento, o termo aparece 15 vezes, mas uma só, em At 13,2, como ritual dos cristãos. Para nós do ocidente latino, o termo só se tornou conhecido no século XVI e utilizado na linguagem eclesiástica oficial na metade do século XIX.

1.2 – Do termo MISTÉRIO

A palavra vem do grego mysterion, derivada de myein, estar fechado. No sentido fundamental, o que está bem escondido e oculto, seja aquilo que é contido, desígnio secreto, seja aquilo que contém. Na Bíblia, aparece como desígnio oculto destinado a ser revelado em palavras e, sobretudo, em atos pelo seu próprio cumprimento.

1.2.1 – Mistério na Bíblia

No AT o mistério se reveste muitas vezes de uma significação puramente profana. “É bom manter oculto o segredo do rei; porém, é justo revelar e publicar as obras de Deus. Agradecei-lhe dignamente. Praticai o bem, e a desgraça não vos atingirá” (Tb 12,7). No NT não tem nenhuma relação com os mistérios sagrados da antiguidade, tanto sob o ponto de vista de sua definição, como de seu conteúdo.

1.2.1.1 – Mistério nos Evangelhos Sinóticos

A palavra não é empregada se não uma vez na expressão o mistério do Reino de Deus. “Dizia-lhes: a vós foi dado o mistério do Reino de Deus; aos de fora, porém, tudo acontece em parábolas”. (Mc 4,11). A significação de tal expressão não é explicitamente precisada, mas não resta dúvida de que designa Jesus Cristo como sendo aquele que Deus designou e enviou para trazer a salvação, de sorte que sua obra não é outra coisa se não a irrupção do Reino de Deus. O conhecimento do mistério do Reino de Deus é uma graça, livremente, dada por Deus. Alguns exegetas traduzem a expressão “em parábolas” por “em enigmas, de maneira enigmática”. Quanto as diferenças que se observam entra Marcos de uma parte e Mateus e Lucas de outra, não têm, na opinião comum, nenhuma importância. Para alguns, entretanto, os mistérios do Reino de Deus se refeririam, em Mateus e Lucas, à doutrina, ao passo que Marcos falaria do mistério como de um acontecimento.

1.2.1.2 – Mistério nos escritos Paulino

O Mistério de Deus é o desígnio escondido, agora revelado e proclamado, de conceder a salvação por Jesus Cristo. Na primeira carta aos Coríntios (2,7), aparece a expressão “sabedoria misteriosa de Deus”. Ensinamos a sabedoria de Deus, misteriosa e oculta, que Deus, antes dos séculos, de antemão destinou para a nossa glória. A sabedoria de Deus, de que se trata, consiste nos desígnio, subtraído ao conhecimento de toda criatura de procurar a salvação pela cruz de Jesus Cristo. Na carta aos Efésios, Paulo coloca o termo mistério como mistério divino da salvação que é Cristo Jesus.

Por fim, após a breve reflexão sobre o termo mistério, cabe-nos compreender que o mistério não cessa quando o homem alcança, em virtude da graça, a consumação prometida.

CAPÍTULO II

MISTÉRIO E LITURGIA

2.1 – Mistério de Deus

Aprouve Deus, na sua bondade e sabedoria, revelar-se a si mesmo e dar a conhecer o mistério da sua vontade, mediante o qual os homens, por meio de Cristo, Verbo encarnado, têm acesso no Espírito Santo ao pai e se tornam participantes da natureza divina. Com efeito, em virtude dessa revelação, Deus invisível, na riqueza do seu amor, fala aos homens como a amigos e conversa com eles, para convidar e admitir à comunhão com ele. Esta economia da salvação faz-se por meio de ações e palavras intimamente relacionadas entre si, de tal maneira que as obras, realizada por Deus na história da salvação, manifestam e corroboram a doutrina e as realidades significativas pelas palavras, enquanto as palavras declaram as obras e o mistério nelas contido. Porém, a verdade profunda contida nesta revelação, tanto a respeito de Deus como a respeito da salvação dos homens, se manifesta a nós na pessoa de Jesus Cristo, que é, simultaneamente, o mediador e a plenitude de toda revelação. (DV 2)

Deus se revela a si mesmo e a nós. A encarnação do Verbo é a apresentação de Deus a humanidade. Não um apresentar-se de caráter apoteótico, mas um conviver no decurso diurno do homem. Jesus é a plenitude da revelação de Deus ao homem. O mediador, o elo de ligação entre o homem e Deus. É Ele a própria presença de Deus no meio da humanidade, Deus tornou-se um ser histórico, viveu entre nós como homem[1].

No diálogo de Jesus com Filipe, podemos perceber, claramente, a identificação de Cristo com o Pai. Cesse de perturbar-se o vosso coração! Credes em Deus, credes também em mim! Filipe lhe diz: “Senhor, mostra-nos o Pai e isso nos basta!” diz-lhe Jesus: “Há tanto tempo estou convosco e tu não me conheces, Filipe? Quem me vê, vê o Pai. Como podes dizer: ‘Mostra-nos o Pai!’ ? Não crês que estou no Pai e o Pai está em mim? As palavras que vos digo, não as digo por mim mesmo, mas o Pai, que permanece em mim, realiza suas obras. Crede-me: eu estou no Pai e o Pai em mim. Crede-o, ao menos, por causa dessas obras. Nesse dia[2] compreenderei que estou em meu Pai e vós em mim e eu em vós. (Jo 14, 1.8-11.20) Deus, tido como mistério insondável, tornar-se presente na vida da humanidade. Jesus é a presença viva do Deus misterioso. Revela-nos a “face divina” no homem Jesus.

Antes do Evento Cristo[3], Deus já se manifestava através de aliança com o homem. Na narração da criação diz que: “Iahweh Deus modelou o homem com a argila do solo, insuflou em suas narinas um hálito de vida e o homem se tornou um ser vivente” (cf. Gn 2,7). O insuflar nas narinas, remete-nos a estar próximo, junto de. Numa exegese responsável, diríamos que Deus quis ficar bem próximo do homem. Bem poderia Iahweh Deus ordenar: surja o homem. Como fez, por exemplo, na separação da água com a terra. A expressão foi “Deus disse”, ou seja, uma “atitude” de quem está longe. Na criação do homem Deus fez-se presente-junto: “Façamos!”. Isso dá-nos a entender que Deus não se esconde, misteriosamente, do homem, pelo contrário, quer se mostrar sempre. Até mesmo quando o homem compreende mal sua liberdade e distancia-se dEle. “Eles[4] ouviram o passo de Iahweh Deus que passeava no jardim à brisa do dia e o homem e sua mulher se esconderam da presença de Iahweh Deus, entre as árvores do jardim” (Gn 3,8).

2.1.1 – Transmissão da Revelação divina ao homem

Sabemos que não há outra Revelação, pois em Cristo se deu toda a plenitude da Revelação, mas não podemos ver a plenitude como estancada, finalizada. Na medida em que nos vamos abrindo a fé, cristã, abrir-se-á a visão e a compreensão da Revelação. Só não podemos é ostentarmo-nos e querermos entender Deus Revelado somente aos cristãos. Deus se revelou a todos os homens. “Quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade”. (1Tm 2,4)

Contudo, diante do mistério de Deus, podemos dizer que o Deus cristão não é só o princípio e a causa suprema do universo e de tudo o que existe. Ele é aquele que está em relação com os homens e lhes comunica a salvação. É o Deus de Abraão, de Isaac, de Jacó, o Pai de Jesus, o Deus hodierno.

2.2 – Mistério de Cristo

A palavra Cristo, embora empregada habitualmente, como nome próprio, o nome Cristo conserva a teologia um valor formal, um valor de consagrado, ungido do Pai. A unção messiânica – mashiah=messias – engloba, eminentemente, o tríplice poder: de rei – “Ao Filho, porém, diz: O teu trono, ó Deus, é para os séculos dos séculos; o cetro da retidão é o cetro de sua realeza. E: Amaste a justiça e odiaste a iniqüidade, por isso, ó Deus, te ungiu o teu Deus com o óleo da alegria como a nenhum dos teus companheiros”. (Hb 1,8-9); de sacerdote – “Deste modo, também Cristo não se atribuiu a glória de tornar-se sumo sacerdote. Ele, porém, a recebeu daquele que lhe disse: Tu és meu Filho, hoje te gerei...” (Hb 5,5) e de profeta – “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou pela unção para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos presos e aos cegos a recuperação da vista, para restituir a liberdade aos oprimidos e para proclamar um ano de graça do Senhor” (Lc 4,18-19).

2.2.1 – Jesus histórico

É reconhecido, por todos, que Jesus de Nazaré introduz um conjunto de comportamento, atitudes, noções que acarretaram profunda transformação da história. Alguns para afirmar esse resultado histórico, tiram Jesus de suas coordenadas sociais e o fazem uma figura situada fora da história em seu agir e na proclamação de sua mensagem. Jesus não agiu como um mágico, recorrendo a métodos miraculosos no intuito de surpreender os condicionamentos históricos. Jesus atuou na história fazendo-se um servo. “Mas se despojou, tomando a forma de escravo. Tornando-se semelhante aos homens e reconhecido em seu aspecto como um homem” (cf. Fl 2,7). Jesus submeteu-se a situação histórica de seu tempo.

Jesus constitui, para os cristãos, a chave histórica da Revelação de Deus. A vida humana de Jesus, na totalidade, para nós significa, verdadeiramente, o canal-via em sua própria pessoa, em sua existência.

Redentor do mundo! Nele se revelou de um modo novo, de maneira admirável, aquela verdade fundamental referente à criação que o livro do Gênesis atesta quando repete mais de uma vez: Deus viu que as coisas eram boas. O bem tem a sua origem na Sabedoria e no Amor. Em Jesus Cristo, o mundo visível, criado por Deus para os homens readquire novamente o vínculo originário com a mesma fonte divina da Sabedoria e do Amor. Com efeito, “Deus amou tanto o mundo que lhe deu o seu Filho unigênito – Jesus”. Assim como no homem-Adão este vínculo foi quebrado, assim o Homem-Cristo foi de novo reatado. (RH 8)

2.2.2 – Cristo na liturgia-Páscoa

O número 1085 do Catecismo da Igreja Católica situa Cristo na liturgia da Igreja.

Na liturgia da Igreja, Cristo significa e realiza principalmente o seu mistério pascal. Durante a sua vida terrestre, Jesus anunciava o seu Mistério pascal pelo seu ensinamento e o antecipava pelos seus atos. Quando chegou a sua hora, viveu o único evento da história que não passa: Jesus morre, é sepultado, ressuscita dentre os mortos e está sentado à direita do Pai “uma vez por todas”.

Para os discípulos, a morte de Jesus foi uma experiência terrível. Como percebemos nos evangelhos, muitos já estavam com a sensação de que tudo havia terminado. Aquele que seria o libertador estava morto numa cruz. Vergonha para uns, escândalo para outros. Na narração dos discípulos de Emaús percebemos, claramente, o sentimento de descrença – “Nós esperávamos que fosse ele quem redimiria Israel; mas, com tudo isso, faz três dias que todas essas coisas aconteceram!” (Lc 24,21).

Se Jesus não tivesse ressuscitado dos mortos, o cristianismo seria apenas um grupo dos amigos de Jesus, unidos na recordação de seus ensinamentos e na melhor reprodução, possível, de seus exemplos. Na ressurreição de Jesus se encontra toda a diferença. Nela está o ponto de partida da fé cristã e seu núcleo central. Ser cristão não consiste em venerar um mestre falecido, nem apenas em manter sua memória viva, nem ainda em praticar sua doutrina. Pelo contrário, ser cristão significa crer que Jesus está vivo hoje.

2.3 – Mistério do homem

O homem não vive uma situação individualista ou num isolamento subjetivista, mas antes, tem uma relação essencial com a comunidade. O homem pode ser considerado, na sua totalidade, em cinco aspectos breves. a) primeiro lugar, é um sopro de vida que vem de Deus[5]; b) O homem é carne, isto é, também saído da terra; c) O homem é espírito, aberto a Deus e ao Seu conhecimento; d) O homem é corpo. Tem a faculdade de se exprimir para fora, de estar em relação; e) O homem é imagem de Deus e chamado à semelhança perfeita[6].

Não devemos, nem podemos, confundir essa visão teológica-bíblica do homem com a visão habitual de que o homem é corpo e alma. Esta análise pode ser mantida, se, pelo menos, não trouxer nenhum prejuízo à unidade do composto humano. Mas a definição do homem por estes dois elementos [corpo-alma] pecará sempre, do ponto de vista da antropologia bíblica, por vários lados. É estática e não manifesta nem o devir do homem e da sua vida, na história, nem a sua origem divina, nem o sentido da sua história.

2.4 – Mistério da Igreja

Do grego ekklésia, derivado de ekkaleo = chamo de, convoco. Reunião dos homens convocados por Deus e pelos ministros da sua salvação. No mundo grego o termo ekklésia significava a assembléia do povo como força política. O mesmo termo é empregado pelos LXX para traduzir o vocábulo hebraico qahal que significava convocação.

Enquanto comunidade que age e atua na história, a Igreja não pode subsistir sem uma organização social e uma estrutura hierárquica. Por este motivo:

Há diversos dons, mas o Espírito é o mesmo; diversidade de ministério, mas o Senhor é o mesmo; diversos modos de ação, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos. Cada um recebe o dom de manifestar o Espírito para a utilidade de todos. A um, o Espírito dá a mensagem da sabedoria, a outro, a palavra da ciência segundo o mesmo Espírito; a outro, o mesmo Espírito da fé; a outro ainda, o único e mesmo Espírito concede o dom de curas; a outro, o poder de fazer milagres; a outro, a profecia; a outro, o discernimento dos espíritos; a outro, o dom de falar em línguas; a outro ainda, o dom de as interpretar. Mas é o único e mesmo Espírito que isso tudo realiza, distribuindo a cada um os seus dons, conforme lhe apraz. (1Cor 12,4-11)

O Espírito suscita nela [Igreja] os diferentes ministérios e carismas.

Na Sagrada Escritura são várias as passagens em que aparece a expressão ekklésia, ora significando a igreja local, ora como reino de Deus. Nesse último caso, podemos atestar em Mt 16,18: “Eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha Igreja, e as portas do Hades nunca prevalecerão contra ela”. O ensinamento de Jesus enquadrava-se no tema do reino de Deus e não numa igreja institucionalizada como muito preferem ver. Entretanto, os fundamentos do conceito ekklésia estão claros nos evangelhos sinóticos. Jesus formou um grupo de discípulos e seguidores. Pediu a esses discípulos uma adesão pessoal. “Estando ele a caminhar junto ao mar da Galiléia, viu dois irmãos: Simão, chamado Pedro, e seu irmão André, que lançavam a rede ao mar, pois eram pescadores. Disse-lhes: ‘Segui-me e eu farei de vós pescadores de homens’. Eles deixando as redes, o seguiram” (Mt 4,18-20).

Portanto, a Igreja de Cristo,[7] e por isso apostólica, seguindo o passo dos apóstolos, conserva, guarda, defende, explica e ensina a Tradição apostólica na palavra e no sacramento, na missão e serviço e autoridade, demonstrando-se mediadora, e não detentora, da Revelação.

2.5 – Mistério do culto

Antes de apresentar o mistério do culto, cabe-nos, brevemente, expô-lo numa terminologia cultural bíblica. O NT dispõe de mais de trinta palavras para exprimir atos cultuais concretos, mas é desprovido, como o AT, de um conceito geral que sintetize tudo. Os termos correspondentes tirados do helenismo, sobretudo dos LXX, são empregados unicamente para os cultos pagãos ou hebraicos ou são entendidos como muitas vezes no helenismo e nos LXX, quase exclusivamente em sentido religioso-moral genérico.

O culto se diferencia de acordo com a dignidade do “objeto”. Há por isto a distinção entre culto absoluto e culto relativo. Em ambos há a distinção entre adoração e veneração, essencialmente diversas. O culto absoluto dirige-se a pessoas por motivo de suas qualidades. O culto absoluto corresponde, analogicamente, a veneração. O culto de adoração dirige-se a Deus. Deus Trindade, Verbo Encarnado.

Vale ressaltar que o culto não se confunde, nem por sua natureza, nem por seu conteúdo, com rito. Culto está mais ligado a uma ação pública, não estática. Enquanto o rito, mesmo sendo público, a uma dimensão criativa-estática. No culto há ritos, mas nem todo rito, necessariamente, há um culto.


CONCLUSÃO

Após termos visto essa, breve, exposição do mistério e liturgia, porque não dizer “o mistério da liturgia”, cabe-nos compreender que a dimensão litúrgica envolve todo um processo, uma trajetória, seja ela antropológica-histórica ou antropológica-teológica. A liturgia celebra a vida do homem em Deus e o mistério de Deus na vida humana. Mostra-nos o “rosto escondido” de Deus na plenitude da Revelação, Jesus Cristo.

A Igreja, sucessora apostólica, é responsável por dinamizar a liturgia. É sabido que a liturgia é “o cume para o qual tende toda ação da Igreja e, ao mesmo tempo, a fonte de que promana sua força. Os trabalhos apostólicos visam a que todos, como filhos de Deus, pela fé e pelo batismo se reúnam para louvar a Deus na Igreja, participar do sacrifício e da ceia do Senhor” (SC 10).

A liturgia é a arte de cativar a Deus, de participar da festa do Amor, no amor. A liturgia é a ação e jamais discursos ou ritualismos. A liturgia é uma ação concreta que explicita, em seu próprio movimento, a relação amorosa de Deus com o homem e vice-versa.


BIBLIOGRAFIA

A Bíblia de Jerusalém. São Paulo, Paulus, 20032.

CANAL, J. M. Liturgia e metodologia, em BOROBIO, D. (org.). A celebração na Igreja.Liturgia e sacramentologia fundamental. Vol. I. São Paulo, Edições Loyola, 1990. pp. 25-36.

Catecismo da Igreja Católica. São Paulo, Edições Loyola, 1993.

CONCILIO VATICANO II. Constituição Dogmática Dei Verbum. São Paulo, Paulinas, 20005.

_______________________. Constituição Sacrosanctum Concilium. São Paulo, Paulinas, 20035.

DUPUIS, J. Introdução a cristologia. São Paulo, Edições Loyola, 1999. pp. 55-75.

ECHEGARAY, H. A prática de Jesus. Petrópolis, Vozes, 1982. p. 34.

JOÃO PAULO PP. II. Carta encíclica Redemptor Hominis. São Paulo, Paulinas, s/d.

MARTIMORT, A. G. Princípios da liturgia. A Igreja em oração. Vol. I. Petrópolis, Vozes, 1988. pp.201-235.

MCKENZIE, J. L. Deus, Homem, Igreja, em MCKENZIE, J. L. Dicionário Bíblico. São Paulo, Paulus, 19846. pp. 230-2; 425-7; 432-4.

VV.AA. Cristo, Culto, Deus, Homem, Igreja, em VV.AA. Dicionário de termos da fé. Aparecida, Editora Santuário, s/d. pp. 216-6; 218; 234-6; 367-8; 379-80.



[1] Não podemos fazer dicotomia entre Jesus-homem e Jesus-Deus. A divindade humanizou-se e o humano divinizou-se. Isso significa que Deus se revelou a tal ponto de se tornar um de nós. Assumiu a condição humana, em tudo foi humano, exceto no pecado. (cf. Fl 2,7)

[2] Segundo a nota da Bíblia de Jerusalém, os profetas designavam assim a ocasião das grandes intervenções divinas. O dia pode designar aqui todo o tempo que se seguirá à ressurreição de Jesus.

[3] Expressão que compreende toda história da salvação, encarnação-morte-ressurreição.

[4] No relato da criação diz-se de Adão e Eva.

[5]Insuflou em suas narinas um hálito de vida e o homem se tornou um ser vivente” – Cf. Gn 2,7.

[6]Deus disse: Façamos o homem à nossa imagem, como nossa semelhança...” – Cf. Gn 1,26.

[7] Entenda-se Reino de Deus.

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